Os efeitos da melancolia como paixão que afeta os personagens, gerando suas ações conturbadas e sentimentos sombrios e anestesiados
O que mais chama atenção no filme “Ataque dos Cães”, de Jane Campion, que está na corrida do Oscar, com destaque para o desempenho de seus atores, é a forma como os personagens principais são caracterizados. Especialmente como suas “imperfeições” são ocultas durante suas jornadas, em que carregam algum sofrimento e perturbações na alma, que o espectador não reconhece.
O que preenche as camadas invisíveis do filme, que move e caracteriza os personagens, algo que não vemos, mas sentimos o que o personagem sente, é a paixão da “melancolia”, a mais densa, mais tensa, e a que mais abala os personagens. E a principal característica desta paixão é que ela é inata e nunca sai do personagem, podendo se misturar a outras paixões, como o ódio, o medo, o desejo de vingança e a culpa, que são paixões adquiridas pelos personagens. A jornada de um personagem é motivada pela busca da liquidação do sentimento de sofrimento causado por essas paixões.
O que leva um escritor ou cineasta a ser verdadeiramente reconhecido é sua percepção das afecções das paixões nos personagens. Quando consegue penetrar nesse universo misterioso e invisível que o afetam (positivos ou negativos moralmente), que é gerado por suas “paixões”, como a raiva, o ódio, a vingança, o medo, a ambição, a culpa ou a melancolia.
Neste sentido, a nova teoria da narrativa baseada na Semiótica das Paixões possui 7 esquemas teóricos para a estrutura narrativa e do personagem para se desenvolver corretamente uma obra de ficção, sendo dois deles o esquema do Dano e Fratura e o esquema das Paixões, dedicados ao desenvolvimento do personagem.
Esta Masterclass irá abordar estes dois esquemas em especial, analisados no filme Ataque dos Cães, obra principal a ser estudada, mas também utilizando outras obras como referência, como os filmes recentes A Filha Perdida, de Maggie Gyllenhaal, e A Pior Pessoa do Mundo, de Joachim Trier, e clássicos como Morangos Silvestres, de Ingmar Bergman, A Doce Vida e Oito e ½, de Federico Fellini, e Jules e Jim, de François Truffaut.
O sentimento que perturba Leda e Nina, em “A Filha Perdida”, é o mesmo; não se sentem aptas a cuidar das filhas, não se sentem mães. Este tipo de efeito, presente em todos melancólicos, é de uma “anestesia” para o mundo sensível dos sujeitos.
O melancólico “não sente”, tem o coração anestesiado, e possui, na maioria dos casos, um “desejo de morte” muito latente, como o personagem de Marcello Mastroianni, que perpassa dois filmes de Fellini, “A Doce Vida” e “Oito e ½”.
Em “Jules e Jim”, de Truffaut, a personagem Catherine, sob efeito do desejo de morte gerado pela melancolia, morre se jogando de carro em um rio, levando consigo Jim, que lhe dá potência para morrer, enquanto Jules, seu divertido marido, lhe doava potência para viver.
O efeito do dano de Phil, a perda do amigo que lhe gerou uma fratura na alma, é tão potente ao ponto de mantê-lo preso àquela vida de castigo, como se sofresse propositadamente por ter perdido Bronco Henry. O dano é mostrado através de um “santuário” que Phil fez para Bronco e quando se masturba com o lenço do amigo morto.
8 e 9 de março, das 19h às 21h
online, via Zoom
Vagas limitadas
Os participantes receberão Certificado de Participação.
A Masterclass será gravada na íntegra e disponibilizada aos inscritos que não puderem assistirem ao vivo.
Masterclass ministrada por Hermes Leal, jornalista, escritor, roteirista e documentarista. Mestre em Cinema pela ECA/USP e doutor em Linguística e Semiótica pela FFLCH/USP com a tese “As Paixões na Narrativa” (2017), na coleção Aplausos da Editora Perspectiva.