ESQUEMAS BÁSICOS DA TEORIA

O curso é formado, basicamente, por “sete esquemas teóricos”: Programa Narrativo, Destinador, Acontecimento Extraordinário, Surpresa, Simulacro Existencial, Dano e Fratura e Cólera e Vingança. Estes esquemas se cruzam formando a teoria narrativa baseada nas ações e nas emoções dos personagens.

1 - Programa Narrativo

Este é o esquema básico, com um núcleo da intriga formado por três funções: sujeito, objeto e destinador, em que o sujeito fará um contrato com um objeto, e sofrerá interferência do destinador no cumprimento deste contrato. Cada personagem, na função de sujeito, precisará de um Programa Narrativo para levar adiante esta intriga em forma de jornada afetiva em três atos.

Este “contrato” corresponde ao primeiro ato, e o segundo ato é chamado de manipulação, porque os personagens precisam ganhar competência para executar uma performance relacionado ao contrato inicial. O terceiro ato está relacionado à sanção da verdade, o julgamento sobre o cumprimento do contrato.

Primeiro Ato             Segundo Ato             Terceiro Ato
Contrato                       Manipulação               Sanção
                                 (Competência/Performance)

A intriga é formada a partir da luta pela posse de valores contidos nos objetos, porque o objeto é atraente para o sujeito por seu valor, e o destinador é atraente por ser doador de saber e poder que o sujeito precisa para executar seu Programa Narrativo numa série ou filme. Todo personagem irá precisar de um Programa Narrativo com o qual irá trabalhar as curvas dramáticas.

2 - Destinador

O esquema do Destinador, muitas vezes o responsável pela intriga entre o sujeito e objeto, é um doador de saber e poder.

O Destinador, como o Dano, são características intrínsecas aos heróis de quadrinhos e outras fábulas modernas, como as da Disney e equivalentes.

Existem ao menos quatro tipos de Destinadores, os que são “persuasivos”, temos também o “transcendente”, além do “autodestinador” e o Destinador “social”.

3 - Acontecimento Extraordinário

O acontecimento sob o ponto de vista da estrutura narrativa: para que hajam cenas fortes que promovam pontos de virada, é necessário que haja um acontecimento extraordinário no personagem, que o abale do ponto de vista da ação, congelando sua cognição, e expondo somente o seu sofrer, em um intervalo em que irá mudar o modo de agir e de existência do personagem.

O acontecimento só é extraordinário se ele for concessivo, se for de imprevisto, de surpresa, e cause um “dano” e uma “fratura” na alma deste personagem. É uma parada no tempo, o personagem não tem noção do mundo das coisas e, quando retorna, está diferente de quando iniciou este acontecimento. A mudança de um personagem de um estado virtualizado para um atualizado, no Simulacro Existencial, é operado por “Acontecimentos Extraordinários”.

4 - Simulacro Existencial


O Simulacro Existencial é um esquema em que o personagem gera no seu imaginário uma necessidade de potencialização de sua alma, em que no primeiro ato se encontra “virtualizado”, porque só tem um “querer”, o segundo ato é a fase de um personagem “atualizado”, que luta para adquirir “saber” e “poder”, para então entrar na fase de “realizado”, no terceiro ato.

Primeiro Ato           Segundo Ato         Terceiro Ato
Virtualizado              Atualizado               Realizado
Querer                        Saber                          Poder

A fase de potencialização é gerada através do Simulacro Existencial, como uma fase antes da realização, em que o personagem antecipa uma realização ainda não realizada, uma concessão, mas também pode ser uma fase que o personagem executa após a realização, em que os eventos ocorridos são postos em memória.

5 - Surpresa

O acontecimento sob o ponto de vista da estrutura do personagem: um personagem em estado de espera, espera o esperado e chega o inesperado. Sem avisar, um objeto chega de repente e atinge em cheio o sentir do personagem, porque ele foi pego de surpresa. O personagem é surpreendido, porque o inesperado é concessivo, não estava previsto para acontecer, mas aconteceu.

Espera – Surpresa/Intervalo – Admiração/Percepção – Paixão

O personagem tem um esquema para mostrar como funciona a Surpresa através do que lhe ocorre após o Acontecimento Extraordinário, quando recupera a cognição, e pode admirar-se por este objeto ou ter uma percepção da realidade que trata este objeto. Admiração x Percepção é o núcleo da Surpresa que, ao se deparar com um objeto inesperado, abre uma concessão do esperado, uma junção concessiva com este objeto.

6 - Dano e Fratura

O esquema do dano é dotar o personagem de sofrimento. O dano é aquilo que o personagem sente que sofreu durante a ocorrência de um Acontecimento Extraordinário, seja através de uma ação ou uma sensação concessiva, que afeta terrivelmente suas paixões. O dano pode ser físico, como no caso dos personagens “quebrados” de “Game of Thrones”, ou na alma, como é o caso de Jon Snow, cujo dano é ser “bastardo”, causando-lhe uma forte paixão da revolta e rebeldia em razão deste dano.

O dano abre uma fratura no personagem que precisa ser sanada, assim como a falta causada pelo dano precisa ser liquidada. O sofrimento é aquilo que dá alma ao personagem, é o objetivo sensível e invisível que move a busca pela potencialização da alma em seu Simulacro Existencial. O esquema dos super-heróis inclui um dano e um sofrimento. É o dano que torna os heróis “super” e o sofrimento é o que lhe dá alma para sensibilizar o espectador.

7 - Cólera e Vingança

Entre as paixões mais tensas que afetam o personagem está a “cólera”. Um personagem sai de um estado calmo a colérico em poucos segundos. Já a paixão da “vingança” é tensa, mas lenta, mais demorada, requer uma estratégia para ser executada e um “ódio”, gerador da vingança e que precisa ser liquidado. O personagem é tomado pela cólera devido a um acúmulo de acontecimentos que culminam em uma explosão. O esquema das paixões afetando o personagem é medido por sua intensidade (a cólera é mais intensa que o “tédio”) e extensidade (o “ódio” e o “rancor” permanecem mais tempo no personagem que a “raiva”, que é passageira), e sua temporalidade, se remetida ao presente, como a “ira” e “cólera”, e ao passado, como a “culpa” e o “remorso”, ou ao futuro, como o “medo” e o “temor”.

Já o esquema da vingança é uma jornada estratégica de liquidação de uma falta, causada por um dano, e da liquidação da paixão do “ódio”, que causa sofrimento ao personagem. O vingador tem várias características. Além do dano em sua alma, por um Acontecimento Extraordinário no passado, há também um “disfarce”, obrigatório, porque toda narrativa de vingança pede uma surpresa no final.
O esquema ajuda o escritor a criar personagens vingativos autênticos, como os que precisam “esconder” o desejo de vingança, e ainda mais, esconder o seu ódio. Demonstra como o mesmo exemplo usado no percurso de vingança de “Medéia” e “Hamlet” também é usado na estratégica narrativa de “Game of Thrones”.